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Daniel Marinho

Ciência Social: Voto Obrigatório - Direito ou Dever de Todos?


Imagem da Capa: Urna Eletrônica

“A soberania popular será exercida pelo sufrágio universal

e pelo voto direto e secreto,

com valor igual para todos, e,

nos termos da lei”

- Art. 14, Constituição Federal, de 1988

CENÁRIO

No próximo domingo, dia 7 de outubro de 2018, 147,3 milhões de brasileiros estarão aptos a votar em deputados, senadores, governadores e presidente.


Hoje, o voto no Brasil é obrigatório para todos os eleitores a partir dos 18 anos e facultativo para analfabetos, jovens entre 16 e 17 anos e maiores de 70 anos. Em caso de não comparecimento, o eleitor deve pagar uma multa e justificar sua ausência. Caso o eleitor deixe de votar ou justificar esta ausência por três turnos seguidos, o título é cancelado e ele fica impedido de acesso a diversos serviços; tais como a renovação ou matrícula em estabelecimento de ensino público, participação em concursos, solicitação ou renovação de passaporte.


A atual descrença do brasileiro na política e no sistema político prometia manter nesta eleição o alto número de abstenções e eleitores que invalidam o voto. No primeiro turno das eleições gerais de 2014, o número de abstenções foi de 27,6 milhões (19,39%), os votos brancos, 4,4 milhões (3,84%), e os votos nulos, 6,6 milhões (5,80%). No entanto, devido a alta polarização podemos ter uma mudança nesta tendência.

Gráfico: Evolução dos Votos Brancos e Nulos e da Abstenção


Este “não voto” levanta novamente o debate a respeito da obrigatoriedade dos cidadãos brasileiros a votar.

Um estudo feito pelo portal institucional Consultoria Legislativa do Senado Federal, em 2004, apontou os principais argumentos favoráveis e contrários a cada uma das propostas de voto:


Os principais argumentos favoráveis ao voto obrigatório que podem ser destacados:

  1. O voto é um direito e um dever, uma responsabilidade perante a coletividade;

  2. A participação constante do eleitorado no processo eleitoral é fator fundamental de educação política;

  3. A maioria dos eleitores participa do processo eleitoral, não gerando dúvidas sobre o seu resultado e tornando-o mais legítimo;

  4. A obrigatoriedade leva a participação, tanto de eleitores bem informados e de melhor escolaridade, quanto de segmentos excluídos da sociedade, que apesar de desconhecerem seus direitos, podem manifestar igualmente sua vontade política.


Para os defensores do voto facultativo, os principais argumentos são:

  1. O voto é um direito subjetivo do cidadão e não um dever cívico, e ele deve ser livre para escolher, tanto na possiblidade de votar, quanto na vontade de abster-se, sem punição do Estado;

  2. A participação nas urnas se dará por pessoas realmente interessadas, isto levará a uma melhora na qualidade do pleito eleitoral;

  3. A maior participação eleitoral, em virtude da obrigação em votar, não quer dizer maior interesse das pessoas nas propostas dos candidatos ou dos partidos políticos; ela não cria, por si só, cidadãos conscientes e maduros politicamente;

  4. O voto facultativo é adotado pela maioria das democracias desenvolvidas;


Segundo as informações do Portal da ACE, Electoral Knowledge Network, projeto que reúne vários dados sobre sistemas eleitorais de todo mundo, em 197 países, o voto é facultativo.

Gráfico: Voto Facultativo x Voto Obrigatório - Cenário internacional

Na América do Sul, a tradição é pelo voto obrigatório: apenas o Suriname, Guiana, Colômbia e Paraguai adotam o voto facultativo.

Em 2015, foi proposto durante o debate para a PEC da reforma política, o fim do voto obrigatório, que foi rejeitado pelo voto da maioria no plenário.


PESQUISAS

E como os brasileiros refletem este debate? Pesquisa feita pelo Instituto Datafolha em 2014 já revelava que 61% dos eleitores são contrários ao voto obrigatório e apenas 34% a favor.


Em junho deste ano, o Instituto GUIMARÃES também entrou neste debate. Em pesquisa realizada com 2.000 eleitores, em 13 estados e no Distrito Federal, fomos em 154 municípios de todas as 5 regiões Brasileiras e perguntamos se “Para você, o voto deve ser: Obrigatório ou Facultativo?” O resultado obtido foi:

Gráfico: Preferência da população brasileira

Tal como apontado pelo Datafolha em 2014, o voto facultativo é preferido pela maioria dos eleitores entrevistados (74,4%), enquanto o voto obrigatório é preferido apenas por 23,3%.


Apesar da maioria do eleitorado mostrar claramente sua preferência pelo voto facultativo, notamos algumas nuances ao estratificarmos os resultados.

Gráfico: Taxa de eleitores favoráveis ao voto facultativo nas diferentes regiões do Brasil

Quando regionalizamos, percebemos que o voto facultativo mostra mais força nas regiões Centro-Oeste e Norte, e menor nas regiões Sul e Nordeste. Enquanto isto, o Sudeste apresenta números bem mais próximos da média nacional.


Os resultados mais interessantes da pesquisa aparecem quando estratificamos a preferência do voto pelo perfil do eleitor, especialmente para faixa etária e renda do entrevistado.


Notamos um aumento da preferência do voto facultativo a partir dos 24 anos, e que se mantêm ao longo das outras faixas etárias. A diferença entre aqueles preferem o voto facultativo em detrimento do voto obrigatório é menor na faixa de 16 a 24 anos.


O apoio ao voto facultativo aumenta conforme a faixa de renda e escolaridade, como podemos observar nos gráficos a seguir:

Gráficos: Opção de Voto x Perfil do Eleitor

O que estes resultados nos remetem é a ideia de que o apoio maior ou menor a obrigatoriedade ou não do voto teria uma ligação com a idade, renda e escolaridade do eleitor. Várias hipóteses poderiam ser levantadas para justificar esta associação, mas a principal delas diz respeito ao grau de consciência desta população jovem, pobre e de grau de instrução mais baixo sobre os seus direitos e deveres como cidadãos, muito derivado da confusão do conceito do voto no Brasil como um direito e uma obrigação cívica, uma função social a ser cumprida.


Outra hipótese seria o medo do clientelismo, já que se o voto fosse facultativo, este segmento estaria muito mais vulnerável a receber pressões e vantagens indevidas para participar, ou não, das eleições.


Conclui-se que existe, ainda, uma necessidade de maior debate a respeito do tema. Se, por um lado, o voto facultativo deixaria livre o indivíduo para decidir se quer ou não participar do pleito eleitoral, ainda existe, por outro, uma boa parte da população que vê na obrigatoriedade do voto um caráter pedagógico, visando construir na sociedade um hábito de votar e de se informar sobre política.


O importante é não perder de vista que o voto, universal e secreto, foi uma grande conquista dos brasileiros ao longo da história. Por isto, é necessário que tenhamos bons eleitores conscientes da importância do seu voto e do que ele representa.

Imagem final: Urna Eletronica

Para mais Ciência Social, acesse: A Democracia.


Daniel Marinho é formado em Ciências Sociais pela UNICAMP,

com especialização em Marketing Político.

Trabalha com pesquisas há mais de 15 anos e atua como sociólogo

e cientista político do Instituto Guimarães desde a sua fundação.



1. Nesta pesquisa do Instituto Guimarães foram entrevistados 2.000 eleitores brasileiros, com amostra: Sul=400 / Sudeste=800 / Centro-Oeste=200 / Nordeste=400 / Norte =200. Todas as entrevistas foram realizadas entre os dias 14 a 19 de junho de 2018. A pergunta foi: “Para você, o voto deve ser: Obrigatório ou Facultativo?”. A margem de erro máxima para os resultados globais é de 2,2 pontos percentuais, para mais ou para menos, dentro de um intervalo de confiança de 95,0%.

2. Outras fontes:


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