Ciência Social: A Democracia
"De facto, já houve quem dissesse que a
democracia é a pior forma de governo, à
exceção de todas as outras que têm sido
tentadas de quando em vez"
- Winston Churchill
Democracia
Quando pensamos em democracia, logo nos vem a ideia de governo, participação política, cidadania, direitos civis e liberdade.
A palavra democracia vem do grego demos (“povo”) e krátia, de krátos (“governo”, “poder”, “autoridade”), o que significaria o “governo do povo”. Os gregos foram os primeiros a elaborar o ideal democrático em que o cidadão é soberano e tem o direito de se governar e decidir o destino da pólis (cidade-estado grega).
A democracia moderna, tal como a concebemos hoje, é pautada em ordenamentos jurídicos e instituições políticas sólidas, as quais representam os três poderes (Executivo, Judiciário e Legislativo). Através do sufrágio universal, com o exercício do voto, a maioria do povo é quem escolhe os seus representantes.
Ordem e Progresso
O Brasil completa um período de trinta anos de democracia em 2018. A redemocratização foi iniciada com a eleição de Tancredo Neves por um Colégio Eleitoral em 1985 e culminou com a Constituinte e a Constituição de 1988.
Acumulamos inúmeros avanços neste período: eleições regulares com alternância de poder, aumento da liberdade de expressão e de manifestação, economia estável e redução da pobreza. Porém, nossa democracia é jovem e ambivalente. Avanços democráticos convivem com instabilidade e desconfiança.
Na América Latina
A ONG sem fins lucrativos Corporación Latinobarómetro, com sede em Santiago do Chile, realiza anualmente entrevistas em 18 países latino-americanos para identificar a percepção das populações acerca do desenvolvimento da democracia, da economia e da sociedade em geral. Aqui, serão analisados alguns dados da pesquisa de 2016.
Enquanto a democracia é apoiada por metade da população latino-americana (54%), existem 7 países onde a maioria dos habitantes não a apoia.
Inclusive, pelo quarto ano consecutivo, o apoio à democracia não melhora: registrou-se uma redução de 7 pontos percentuais desde 2010. Ao passo que o apoio ao regime autoritário não aumentou. Enquanto isto, o maior aumento foi registrado entre aqueles que se mostram indiferentes a qualquer um dos dois tipos de governo, e isto vem acontecendo desde 2010.
Ainda, seis países registraram quedas bruscas no apoio à democracia entre 2015 e 2016: Brasil (22%), Chile (11%), Uruguai (8%), Venezuela (7%), Nicarágua (7%) e El Salvador (5%).
Dos países pesquisados, o Brasil foi o que apresentou a maior queda: saiu de 54% em 2015 para apenas 32% em 2016, ficando à frente apenas da Guatemala no que tange a apoiar a democracia como regime preferível em detrimento de qualquer outra forma de governo.
No Brasil
A democracia brasileira passa por uma grave crise, sobre isto não restam dúvidas. Existe um enorme fosso entre os cidadãos e seus representantes. As instituições políticas, principalmente os partidos, perderam a credibilidade: muitos deles estão envolvidos em escândalos de corrupção. Soma-se a isto a qualidade ruim dos serviços públicos básicos, a interferência do poder econômico no processo eleitoral e o despreparo do eleitor.
O Instituto Guimarães realizou uma pesquisa em 9 capitais do Brasil com 2.000 eleitores em setembro de 2017. Para a maioria da população, a democracia ainda aparece como sendo a melhor forma de governo (72,1%) para o país e um governante civil (55,2%), o melhor representante para tirar o Brasil da crise.
A preferência por um presidente civil aumenta conforme sobe o grau de escolaridade e renda. Um governante civil é preferido por 64,0% daqueles com nível superior e por 61,5% entre aqueles com renda familiar maior de 5 salários mínimos.
A preferência por um presidente militar se mostrou maior entre os homens (39,8%) que mulheres (26,9%). Além disso, conforme a idade aumenta, a preferência por um presidente militar também aumenta, sendo que 38,3% das pessoas com mais de 60 anos o preferem.
Na questão da escolha da democracia como melhor regime, a educação e a renda se mostram novamente fatores importantes. Nota-se que o regime autoritário tem uma aceitação aproximadamente duas vezes mais alta pela população da menor escolaridade (29,9%) em relação à da maior escolaridade (13,1%), o que também ocorre para a renda (26,5% das pessoas na faixa de até 01 salário mínimo preferem o regime autoritário contra 13,8% das que estão na faixa de 05 salários mínimos ou mais).
Quando questionada se o regime militar foi pior, ou melhor, para o Brasil, a maioria das pessoas diz ter sido pior (47,5%). Entretanto, a diferença entre as percepções favoráveis e desfavoráveis ao militarismo para essa questão é menor se comparada às anteriores.
Existe uma diferença na percepção da população com mais de 60 anos: nessa faixa etária, as avaliações favoráveis (42,3%) e desfavoráveis (41,9%) se igualam; em contrapartida, para todas as outras faixas, a maioria diz que o regime militar foi pior.
Também existe uma diferença entre os sexos: 38,0% dos homens avaliam que o regime militar foi bom para o país, enquanto somente 26,6% das mulheres disseram o mesmo. Novamente, é interessante notar uma avaliação diferente por parte de quem tem maior estudo: a avaliação do regime militar tende a piorar à medida que cresce o grau de escolaridade do entrevistado (até fundamental incompleto, 41,2% acham o regime melhor e 35,3%, pior, contra, respectivamente, 24,6% e 57,1% das pessoas com ensino superior completo).
É provável que estas diferenças tenham muito a ver com a vivência política de cada um à época do regime militar brasileiro e às marcas que ele deixou em cada geração no país.
A conclusão a que se chega é que a jovem democracia brasileira segue o seu natural processo de construção. Que sua crise é uma oportunidade e deve ser enfrentada com ações concretas. Investir na educação do seu povo é uma das condições básicas para que a população consiga entender os processos de representação e seja realmente livre nesta escolha. Uma democracia só terá sentido se for verdadeiramente compreendida pelo povo.
Daniel Marinho é formado em Ciências Sociais pela UNICAMP,
com especialização em Marketing Político.
Trabalha com pesquisas há mais de 15 anos e atua como sociólogo
e cientista político do Instituto Guimarães desde a sua fundação.
Para mais informações acerca do tema democracia, acesse:
Pesquisa do Latinobarómetro: Informe Latinobarómetro 2016
1. A pesquisa do Latinobarómetro aplicou 20.204 entrevistas entre 15 de maio e 15 de junho de 2016, com amostras representativas de 100% da população de cada um dos 18 países latino-americanos. No Brasil, foi realizada pelo Ibope Inteligência, com 1.204 pessoas e margem de erro de 2,8 pontos percentuais. Os gráficos aqui demonstrados foram obtidos a partir dos dados da pesquisa.
2. Na nossa pesquisa foram entrevistados 2.000 habitantes de 9 capitais do Brasil (São Paulo, Rio de Janeiro, Belo Horizonte, Curitiba, Porto Alegre, Recife, Salvador, Brasília e Cuiabá). As entrevistas foram realizadas entre os dias 01 e 08 de setembro de 2017. As perguntas foram: “Você acha que para superar a crise é melhor um presidente militar ou civil?”; “Você acha que para o Brasil é melhor uma democracia ou um regime autoritário?”; “Você acha que o regime militar foi pior, ou melhor, para o Brasil?”. A margem de erro máxima para os resultados globais é de 2,1 pontos percentuais, para mais ou para menos, dentro de um intervalo de confiança de 95,0%.